Reunir a família em volta de uma farta mesa de comida, trocar presentes e celebrar o Natal é um costume comum no Brasil. Mas imagine tudo isso em um país que vive uma guerra civil há três anos. Refugiados em Vila Velha, 16 cristãos sírios passarão finalmente a data em paz depois de um longo tempo convivendo diariamente com bombas e tiros.
Acolhidos pela Organização Não Governamental (ONG) Missão em Apoio À Igreja Sofredora (Mais), eles estão abrigados em um centro da instituição no Centro da cidade e ganharam a companhia das famílias voluntárias do projeto na noite natalina. Houve um culto seguido da tradicional ceia.
Este será o primeiro Natal que o pequeno Jac Abdullah poderá celebrar de verdade. Com 4 anos, ele sempre esteve em meio à guerra e chegou com os pais, o chefe de cozinha Feras Abdullah, 40, e a enfermeira Lina Abdullah, 33, há 26 dias no Brasil.
“É muito confortável estar aqui e ter uma paz interior. E Jac ficou muito feliz de ver o Papai Noel”, conta o pai do menino que foi a um shopping encontrar o bom velhinho.
Tristeza
Na Síria, onde naturalmente já não há grande mobilização para a época porque a maioria segue o islamismo, nada tem lembrado o Natal quando ele chega. Nos últimos três anos, a tristeza geral não permite que haja uma celebração. “As famílias sírias estão de luto porque todos perderam familiares na guerra”, comenta Feras, que teve muitas dificuldades antes de fugir do país árabe.
Antes de viajar para cá, os três tentaram sair da cidade de Homs, na Síria, uma das mais atingidas pelos confrontos, por três vezes para pegar um avião no Líbano. Mas desistiram porque identificaram barricadas de rebeldes, que matavam cristãos que tentavam fugir.
Clima
Nas quase três semanas em que estão em terras brasileiras, a estilista de vestido de noivas, Therese Hanna, 47, o engenheiro Ramez Nassour, 58, e o filho deles, Lamuel Nassour, 15, se encantaram pelo clima natalino que toma as ruas.
Eles vieram da cidade de Lataquia e também conseguiram sair pelo Líbano. “É muito duro ser cristã lá, não há clima para comemorar a data. Há muita morte e os jovens são forçados a ir para guerra. Todo dia morre alguém que conhecemos”, diz Therese.
Ela cita o versículo “Glória a Deus nas alturas, paz na terra, boa vontade para com os homens”, conhecido por estar na descrição da Bíblia desta época, para dizer que isso não está acontecendo no país árabe.
Mas nem sempre foi assim e Ramez lembra saudoso a época em que era possível celebrar o nascimento de Jesus. “Antigamente podíamos reunir as crianças lá para dar presentes e cantar, mas agora isso não é possível”, lamenta.
Para as famílias dos refugiados, entretanto, há a esperança de construir uma nova vida que está apenas começando. E o Natal deve marcar o início dos tempos de paz para eles, longe dos temores da guerra.
Entenda a situação
Guerra Civil
A Primavera Árabe inspirou os rebeldes sírios tomarem as ruas em 2011 contra o regime de Bashar al-Assad. Desde então, os embates já destruíram cidades inteiras
Refugiados
A Agência da Organização das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) registrou 429.823 refugiados da Síria para outros países até o dia 12 de dezembro de 2012. Na mesma data deste ano eles já eram 2.243.139. Boa parte deles são cristãos, cerca de 8% da população perseguidos pelos rebeldes fundamentalistas adeptos do islamismo.
Vila Velha
No Centro da Mais os refugiados já são 16, mas até o Natal esse número pode crescer. A expectativa é de que nos próximos meses mais 80 deles cheguem por aqui. Aos poucos eles serão enviados para outros Estados, com probabilidade de serem acolhidos por comunidades árabes no Brasil.
Fonte: A Gazeta