Sophia e Olivia podem estar entre os nomes de meninas mais populares no Ocidente nos dias de hoje, mas no centro de trânsito de Dzaipi, no norte de Uganda, o nome vencedor para recém-nascidas é Nyaring. Na língua Dinka, o nome significa “corrida” ou “fuga”, o que se encaixa perfeitamente às circunstâncias sob as quais elas vieram ao mundo.
A pequena Nyaring Panchol, com pouco mais de quatro semanas de vida, nasceu debaixo de uma árvore durante a fuga de sua mãe do conflito no Sudão do Sul. Ela é uma das dezenas de bebês com esse nome por aqui.
A mãe Athieng Agok, de apenas 19 anos, estava no final da gravidez quando homens armados começaram a atirar e queimar casas em sua cidade perto de Bor, no estado de Jonglei, em 18 de dezembro passado, três dias após o jovem país entrar em uma onda de violência. Ela correu para o mato, e quando as dores do parto começaram ela deitou-se sob a sombra de uma árvore.
Felizmente ela tinha sua mãe, Angelina Ayun de 35 anos, para ajudar. Durante todo o dia, com tiros ecoando em torno delas, as duas se escondiam no mato quando as contrações de Athieng se tornavam mais frequentes. “Havia uma enfermeira conosco, mas ela ficou com medo e fugiu. Então, era apenas eu”, disse Angelina.
Finalmente à meia-noite, a pequena Nyaring veio ao mundo. O parto foi tão doloroso que Athieng desmaiou. Mas, quando ela acordou, teve que reunir todas as suas forças para continuar sua jornada para longe da luta – primeiro em um caminhão da ONU para a capital, Juba, e depois de carro até a fronteira com Uganda.
“Eu não estava me sentindo bem, tive tosse e diarreia. Mas não havia tempo para esperar”, lembra a jovem mãe. “Eles estavam matando as pessoas”, completou.
Numa coincidência do destino, Athieng nasceu sob as mesmas circunstâncias. Grávida, sua mãe foi forçada a fugir em 1990 quando a região onde hoje é o Sudão do Sul estava em plena guerra civil – que durou 22 anos e levou à independência do mais jovem país do mundo. Angelina também deu à luz no meio do mato, enquanto fugia para a província de Western Equatoria, que hoje fica no Sudão do Sul.
No mês passado, enquanto o conflito separava sua família, o marido de Athieng seguia em uma direção diferente da sua. Em Uganda, já em segurança, Athieng conseguiu ligar para seu marido e dizer que ele tinha uma filha. Mas a ligação não durou tempo suficiente para ela descobrir onde ele estava.
Agora, as três gerações de mulheres vivem em uma pequena tenda dada a elas pelo tio de Athieng. O ACNUR está construindo mais tendas familiares diariamente e priorizando as crianças desacompanhadas, idosos, doentes, deficientes e novas mães, mas ainda não há abrigo suficiente para todos.
Enquanto um número significativo de mulheres dá à luz todos os dias no centro de saúde de Dzaipi, muitas outras – que desconhecem os serviços – estão tendo seus filhos no próprio centro de trânsito, muitas vezes em campo aberto. A agência de refugiados da ONU está usando voluntários e cartazes para divulgar que os serviços de saúde estão disponíveis gratuitamente.
“Temos grandes desafios com a falta de trabalhadores locais por causa de todos os novos refugiados que estão sendo atendidos no centro de saúde”, disse Khamis Khamis, oficial regional de saúde do ACNUR. “A maternidade também é pequena, com apenas 10 camas para toda instalação, enquanto há muitas mulheres grávidas no centro de trânsito. Nós estamos trabalhando com nossos parceiros da área de saúde para tentar resolver essas lacunas”.
Athieng e seu bebê já foram encaminhados ao centro de saúde para um exame de pós-natal e recebeu um kit de utensílios do Fundo de População da ONU contendo, entre outras coisas, sabão, roupas íntimas e um envoltório de pano para as novas mães. O ACNUR pretende mover Athieng e sua pequena família o mais rápido possível para perto da colônia de Nyumanzi, onde eles receberão terra e ferramentas para construir uma casa.
Por ora, está levando um tempo para que a família perceba que sua provação está acabada. “Nós ainda sonhamos que estamos fugindo. Sentimos que ainda estamos no meio do mato”, diz Angelina.
“Ninguém é forçado a deixar seu país sem temor”, acrescenta ela, depois de fugir uma segunda vez sem absolutamente nada. Mas agora ela não pode imaginar que está tendo uma chance para voltar para casa uma segunda vez. “Vou ficar aqui, pois a guerra vai durar para sempre”.
Por Lucy Beck no Centro de Trânsito de Dzaipi, em Uganda.
Por: ACNUR