Com medo de ficar na Síria, com medo de chegar às fronteiras da “Fortaleza Europa”

quinta-feira, março 20, 2014

Inaam, refugiada síria que vive na Grécia, participa hoje em Atenas na campanha da AI "SOS Europa, as pessoas antes das fronteiras."

Inaam, refugiada síria que vive na Grécia, participa hoje em Atenas na campanha da AI “SOS Europa, as pessoas antes das fronteiras.” Foto: Anistia Internacional

Ela fala grego perfeitamente, de forma clara e com confiança. Inaam, de 32 anos, é uma dos muitos sírios que estão a residir em Atenas desde 2006. A mãe e o irmão estão com ela, mas três irmãs e as famílias delas permanecem na Síria. Inaam acompanha bem de perto as notícias do que se passa no seu país natal.

“Sempre que vejo uma imagem nova da guerra, telefono-lhes imediatamente para me tranquilizar, para saber se ainda estão vivos”, conta Inaam. A cidade de onde é oriunda, Al-Rakka, no norte da Síria, tem sido devastada pela violência do conflito. “Às vezes não conseguimos falar com elas, porque as comunicações estão em baixo, e a minha mãe chora o dia inteiro. Ela diz muitas vezes que quer voltar e tento explicar-lhe que isso é impossível”.

Inaam vê as imagens dos bombardeamentos intensos totalmente horrorizada. “Ponho a mão no coração e morro de preocupação. As imagens das pessoas, lá, de olhos no céu a tentarem perceber onde a bomba vai cair…” Esta refugiada síria relata que um dessas bombas destruiu a casa de uma das suas tias e feriu a sobrinha.

As irmãs de Inaam e as suas famílias estão a pensar em fugir da Síria. “Mas isso não é fácil. Eles querem salvar as suas vidas e dos seus filhos, e que estes tenham uma educação como deve de ser. Mas receio o que lhe acontecerá se fizerem a viagem até às fronteiras europeias. A vida é muito difícil aqui para os refugiados”, sublinha.

Inaam é uma ativista empenhada. Em janeiro de 2014, junto com outros ativistas da Amnistia Internacional, esteve envolvida num protesto contra o afogamento de refugiados e migrantes no Mar Egeu. A guarda-costeira grega estava alegadamente a tentar forçá-los a virarem o barco em que viajavam de novo em direção à Turquia. No naufrágio da embarcação, perto da ilha de Farmakonisi, morreram 11 pessoas, oito delas eram crianças.

Estes ativistas tentam também ajudar outros novos refugiados que chegam da Síria. “Fazemos tudo o que podemos: compramos-lhes alguma comida e tentamos encontrar lugares onde possam ficar. E enviamos medicamentos e alimentos para os campos de refugiados na Turquia”, conta Inaam.

Hoje, esta refugiada síria participa em Atenas na ação europeia de lançamento da campanha da Amnistia Internacional “SOS Europa, as pessoas acima das fronteiras”. Um dos focos desta ação tem lugar em Bruxelas, bem às portas do edifício do Conselho da União Europeia, na Praça Schuman, onde os ativistas vão despejar quatro toneladas de areia para sinalizar o alerta aos líderes europeus sobre o tratamento abusivo e indigno dado aos migrantes e candidatos a asilo  nas fronteiras da Europa.

“Mesmo que seja só mais uma pessoa que fique a saber do que se está a passar, isso é quanto basta para mim. Porque, então, essa pessoa também pode fazer alguma coisa”, diz ela.

Oportunidade crucial para passar mensagem aos líderes europeus

Temos agora uma oportunidade crucial para dizer aos líderes europeus que não concordamos com a “Fortaleza Europa ” nem com a forma como refugiados e migrantes são tratados nas fronteiras da União Europeia. Apoiantes da Amnistia Internacional por toda a Europa vão exercer pressão nesse sentido sobre os candidatos nos seus países às eleições europeias, que estão agendadas para maio próximo. E, em junho, os chefes de Governo da União Europeia vão reunir-se para discutir e definir a estratégia sobre migração e asilo para os próximos cinco anos.

Queremos que os líderes europeus adotem políticas que salvem as vidas das pessoas e que tratem os migrantes e candidatos a asilo com dignidade. As pessoas não deviam ser fechadas meses a fio, nem afogarem-se quando tentam chegar à segurança na Europa. Somos capazes de fazer melhor do que isto.

Com formação académica, com um trabalho e com documentos que provam que reside legalmente na Grécia, Inaam é uma das privilegiadas pela sorte. Na Síria era professora de artes de crianças, as quais ensinava a pintar. Agora trabalha num dos maiores hospitais de Atenas como intérprete. Terminou a faculdade em janeiro passado, tendo-se licenciado em Administração de Empresas.

Antes de nos despedirmos, Inaam diz-me que deseja que a Síria “volte a unir-se, num só coração, em liberdade e democracia para todas as pessoas”. Entretanto, insta a Grécia e todo o resto da Europa a porem as pessoas em primeiro lugar e a ajudarem a Síria e os seus refugiados.

“Porque, a sério, se os sírios não são refugiados, quem o é?”, pergunta Inaam.

Fonte: Expresso


Faça seu comentário

O seu endereço de email não será publicado Campos obrigatórios são marcados *

Você pode usar estas tags e atributos de HTML: <a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <strike> <strong>

Voluntários

Loja Virtual

Em Breve
Close