Dezenas de milhares de menores não acompanhados pelos pais ou por outros parentes estão entrando de forma ilegal nos Estados Unidos pela fronteira ao Sul do país, forçando o Congresso e o governo do presidente Barack Obama a lidarem com uma crise humanitária e um dilema orçamentário. Cerca de 60 mil crianças chegaram aos EUA este ano, número dez vezes maior que em 2011, quando seis mil menores entraram ilegalmente no país. Agora, Washington está tentando descobrir como pagar sua alimentação, habitação e transporte.
E o número de imigrantes sem documentos desacompanhados e menores de 18 anos provavelmente irá dobrar em 2015 para cerca de 130 mil, um custo de US$ 2 bilhões ao contribuinte — e um aumento de US$ 868 milhões segundo estimativas do governo. A falta de moradia para estas crianças, algumas com apenas 3 anos, tornou-se tão grave que um abrigo de emergência na Base Aérea de Lackland, no Texas, foi aberto para acomodar mil menores, de acordo com o secretário de Segurança Interna, Jeh Johnson.
O tema é um motivo a mais de desgaste entre democratas e republicanos, que discordam sobre como reescrever as leis de imigração. Com uma legislação abrangente estacionada, Obama pensa agora nos pequenos passos administrativos que poderiam ser tomados, e que devem ser anunciados no mês que vem. Não há detalhes delineados, mas grupos de imigração vêm pressionado o presidente americano a manter as famílias unidas.
— Esta é uma crise humanitária, que exige uma resposta humanitária — disse a presidente do Conselho de Apropriações do Senado, Barbara Mikulski.
Com um desafio iminente de financiamento ainda maior para 2015, a democrata acredita que as crianças possam acabar sendo colocadas em celas federais destinadas a adultos — o que faria com que recursos de outros programas, como o de ajuda aos refugiados, fossem deslocados para ajudar a cobrir o custo de US$ 252 por dia de prisão.
Mark Lagon, que coordenou os esforços do governo de George W. Bush para combater o tráfico de seres humanos, disse que o aumento acentuado dos menores desacompanhados deve-se à melhoria da economia nos EUA e à escalada da violência na América Central. De acordo com ele, houve uma diminuição na migração para os Estados Unidos no período 2008-2010, o que refletia a crise econômica do país, e que agora se inverteu.
— Como novamente que se percebe a possibilidade de uma vida melhor nos Estados Unidos, ou seja, que vale a pena o risco, vemos pais incentivando seus filhos a fazer uma viagem perigosa de países como El Salvador e Honduras — disse Langon, hoje professor na Universidade de Georgetown e um membro sênior do Conselho de Relações Exteriores.
Violência é causa das migrações - Um relatório do Alto Comissariado da ONU para Refugiados (Acnur), com base em entrevistas com 404 crianças que deixaram seus país de origem, com idade entre 12 e 17 anos, revelou que 70% o fizeram pela violência doméstica ou a causada pelo crime organizado, de cartéis de drogas ou de agentes do Estado.
Suyen G., que pediu para seu nome completo não fosse divulgado, conta que deixou Honduras há dois anos aos 16, depois de pagar US$ 9 mil dólares a um traficante para levá-la para os Estados Unidos.
— Eu não sabia que era ilegal, porque muitas pessoas faziam isso — disse, com a ajuda de um tradutor.
Uma vez nos EUA, ela foi forçada a trabalhar sem remuneração por um mês na casa de um estranho, antes de ser transferida para outro local, onde preparava as refeições, também de graça, para 300 trabalhadores imigrantes. Só depois, foi autorizada a viajar para o norte da Virgínia, onde encontrou sua mãe.
Rebecca Walters, advogada que presta assistência a cerca de 60 imigrantes em casos parecidos, ajudou Suyen a ganhar um status especial de proteção e eventualmente um “green card” que lhe permitiria trabalhar legalmente nos EUA Segundo ela, os menores que fogem de violência doméstica em seu país têm boa chance de ganhar proteção, mesmo se forem apanhados na fronteira. A lei, no entanto, não reconhece a violência causada pelo tráfico de drogas como motivo para protegê-los.
Fonte: Negócio Fechado