No norte da Nigéria, o território do Boko Haram, “só há medo”

sexta-feira, junho 27, 2014

Ikorodu, um dos locais onde a Loving Gaze actua. Foto: Loving Gaze

Ikorodu, um dos locais onde a Loving Gaze actua. Foto: Loving Gaze

Britus viu morrer um irmão e um primo às mãos do grupo terrorista. É membro da Loving Gaze, uma ONG católica que tenta melhorar as vidas dos nigerianos.

“Havia uma situação de terror onde eu vivia, havia atentados de noite. As ruas e as estradas eram perigosas. As pessoas trancavam-se em casa, mas eram mortas na mesma”. Britus Dingus sobreviveu a ataques do Boko Haram, grupo militar islâmico que tem espalhado o terror no norte da Nigéria.

A mesma sorte não teve um irmão. “Era oficial de polícia – um inspector – e quando saiu para ir trabalhar foi morto”, conta àRenascença. O radicalismo matou também um primo de Britus Dingus. “Estava a viajar e ficou preso numa emboscada, por desconhecidos… encontrámos o corpo aos pedaços”.

Britus Dingus vivia em Taraba, no norte (território privilegiado das acções do Boko Haram), um dos estados da república federal nigeriana. Lá, graças ao Boko Haram, vivia uma situação de “medo e insegurança permanente”.

Britus, que tem hoje 36 anos, participava num retiro em Lagos, no sul, quando lhe telefonaram de casa. Com um conselho: que não regressasse a Taraba. “A situação tinha piorado e corria risco de vida”, conta. Desde Maio vive e trabalha em Lagos.

O norte da Nigéria está a ferro e fogo e praticamente todos os dias explode uma bomba, alguém é raptado ou civis desarmados são mortos por radicais.

A maior parte dos ataques são atribuídos ao grupo islamita Boko Haram. Escolas, igrejas, instalações militares, edifícios governamentais e agrupamentos de pessoas (para ver jogos do Mundial de futebol, por exemplo) são alvos privilegiados do grupo, que ficou célebre depois do sequestro de quase 300 raparigas em Abril passado.

Erradicar da Nigéria todos os cristãos e outras minorias religiosas é um dos seus principais objectivos. Aldeias, escolas e instituições cristãs estão entre os alvos preferidos do Boko Haram. Ao domingo, por exemplo, são comuns os ataques durante a missa.

Apoiar sempre
Aconselhado a não voltar a Tabara, Britus acabou por ficar a viver em Lagos, onde arranjou emprego – algo que no norte é “praticamente impossível”. Trabalha na organização não-governamental Loving Gaze, presente na Nigéria há mais de 25 anos.

A Loving Gaze “assegura assistência médica às pessoas em Lagos, em três locais diferentes”. “Também ajuda quem precisa com roupa e alimentos para as crianças. E tem duas escolas numa cidade e também uma outra em Taraba. Também ajudamos muitos refugiados, cerca de 700”, conta.

Manter escolas, estabelecimentos de saúde e centros de apoio aos refugiados são os principais focos de acção da organização, disse à Renascença, por e-mail, a italiana Barbara Pepoli, responsável da organização católica.

Na cidade de Ikorodu ajudam no “combate à fome e têm três centros nutricionais para crianças subnutridas”. A Loving Gaze é também responsável por um centro que ajuda doentes com sida e outro para pessoas com tuberculose.

E a comunidade internacional o que pode fazer? Uma “única coisa”: “ajudar os deslocados que tiveram de deixar as suas casas e ajudar-nos nas necessidades mais básicas”.

Apesar das dificuldades e da insegurança, os responsáveis da organização continuam a viajar até algumas cidades e vilas do norte da Nigéria.

Lá gerem “duas escolas com 1500 alunos e um centro de saúde com 70 mil pacientes por ano”. Disponibilizam e ajudam a gerir microcrédito a 60 mulheres. Apoio nutricional a 250 crianças é outra das acções que levam a cabo no norte.

“Até há poucos anos atrás era possível andar por toda a Nigéria. Dois dias bastavam para ir de carro até ao norte e voltar. Agora não é seguro andar nas estradas, pelo que reduzimos as visitas aos lugares onde prestamos ajuda”, diz Pepoli.

“A situação do norte é muito crítica. Não há trabalho e há medo. Mas [apesar do risco] as pessoas continuam a procurar os seus amigos. E eu quando posso também o faço.”

Fonte: Renascença


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