Na última terça-feira (19), imagens da decapitação de um repórter fotográfico norte-americano pelo grupo Estado Islâmico (EI) chocaram o mundo. As cenasevidenciaram a brutalidade da violenta campanha empreendida na Síria e no Norte do Iraque, onde o grupo, no início do mês, invadiu áreas sob controle dos curdos deixando mais de 1 milhão de refugiados. A nova organização, fundada em 2004, a partir do braço iraquiano da conhecida Al Qaeda, tem a proposta de recriar o califado – a forma islâmica de governo, extinta em 1924 -, que representa a unidade política do mundo islâmico e sobrepõe a ideia de pertencimento nacional, extinguir as fronteiras e impor a sharia, a lei islâmica.
“Não reconhecem a legitimidade dos Estados que foram implementados no Oriente Médio, a partir dos interesses ocidentais, e então, simbolicamente, por exemplo, queimam os passaportes, as identidades nacionais. Querem criar uma identidade árabe, mas com base numa sustentação sunita do Islã”, explica o professor da Universidade de Brasília (UnB) Pio Penna, diretor-geral do Instituto Brasileiro de Relações Internacionais (Ibri).
Segundo Penna, a desestabilização do governo xiita no Iraque, que não soube se articular com os sunitas, outro ramo do islamismo, e com os curdos, etnia que vive no Norte do país, foi o cenário propício para a expansão do Estado Islâmico. “O governo xiita não soube fazer uma composição adequada e sua legitimidade foi erodida. O Estado Islâmico foi explorando essas brechas, principalmente na Região Norte do país”, disse. Para o professor, os Estados Unidos não conseguiram cumprir a promessa de levar democracia ao Iraque após a invasão de 2003, que resultou na queda de Saddam Hussein, e o Estado iraquiano foi se “esfacelando”.
“O nome inicial era Estado Islâmico do Iraque e do Levante, que é a região da Síria. Eles ganharam tanta confiança que mudaram o nome para Estado Islâmico, tirando a dimensão regional. A noção do califado é voltar ao império árabe muçulmano”, diz Penna.
Grandes potências, como os Estados Unidos, a Alemanha, o Reino Unido e a França, elevaram suas preocupações nos últimos dias e anunciaram a ampliação do apoio, com efetivos militares e armas, à resistência contra o EI – composta por curdos e xiitas, no Iraque.
Saiba mais sobre o conflito
Grupos religiosos islâmicos: xiitas x sunitas
Sunitas: maior corrente do islamismo. Representam quase 90% da população muçulmana. No Iraque, no entanto, não passam de 20%. Os sunitas, originalmente, tinham uma interpretação mais flexível dos textos sagrados e ação política e religiosa mais conciliatória e pragmática, permitindo diálogo maior com outras religiões.
Xiitas: Representam cerca de 10% dos muçulmanos, mas, no Iraque, são 60% da população, concentrada principalmente no Sul. Seguem princípios mais rígidos e acreditam que apenas os líderes descendentes da família de Maomé são aprovados por Alá e, portanto, têm capacidade de tomar as decisões mais acertadas. Os confrontos com os sunitas começaram no ano 632, com a morte do profeta, seguida pela disputa sobre quem o sucederia como califa.
Etnias: Árabes e Curdos
Árabes: São o maior grupo étnico do Oriente Médio, com cerca de 350 milhões de pessoas. O maior fator de unidade entre os árabes não é a religião, mas sim o idioma. São maioria no Egito, na Jordânia, na Síria, no Líbano, no Iraque, nos países da península Arábica e na Palestina.
Curdos: Grupo étnico nativo da região que abrange áreas do Irã, Iraque, da Síria, Turquia, Armênia e Azerbaijão, chamada Curdistão. Falam o idioma curdo e são mais de 26 milhões de pessoas, representando o maior grupo étnico sem Estado do mundo. No Iraque, representam 15% da população.
Yazidis: Minoria que faz parte da etnia curda. Os yazidis acreditam em reencarnação e não seguem nenhum livro sagrado.
Estado Islâmico: Também conhecido como Isis, sigla em inglês para Estado Islâmico do Iraque e da Síria, é um grupo muçulmano extremista fundado em 2004 a partir do braço da Al Qaeda no Iraque. Em janeiro deste ano, o EI declarou que o território sob seu controle passaria a ser um califado, a forma islâmica de governo, extinta em 1924, que representa a unidade política do mundo islâmico e que sobrepõe a ideia de pertencimento nacional, pregando o fim de fronteiras e a imposição da sharia.
Sharia: Direito Islâmico. Em várias sociedades islâmicas não há separação entre religião e legislação, dessa forma, as leis são baseadas nas escrituras sagradas e nas interpretações dos líderes religiosos.
Jihadistas: Em árabe, jihad significa empenho, esforço. No islamismo, é entendida como luta consigo mesmo em busca da fé perfeita e o esforço para levar a religião islâmica a outras pessoas.
Fonte: Diário Regional