No início desta semana, Amina* pensou que fosse morrer. Abrigada em uma mesquita com outras vítimas da violência na República Centro Africana (RCA), ela foi cercada por homens armados que atiraram em sua perna e mataram seus amigos. Eles também lançaram uma granada contra uma mesquita, matando 11 pessoas que haviam procurado refúgio por ali.
Mesmo com um ferimento de bala na perna, Amina procurou abrigo no centro de trânsito de Bossambele, a 170 km a noroeste de Bangui, capital da RCA. Ela estava em um grupo de 58 pessoas que tinham procurado ajuda no centro
Abdoulaye*, imã da mesquita onde aconteceu o ataque, também foi escondido ao centro. “A única maneira de sobreviver é fugir”, disse ele ao ACNUR após seu sofrimento ter chegado ao fim. “Fomos confrontados por uma situação sem nenhuma escolha – apenas a morte”.
O ACNUR e seus parceiros humanitários compartilharam das preocupações de Amina e Abdoulaye em um país onde a violência, durante o ano passado, deixou mais de 900 mil pessoas deslocadas internamente. A origem do conflito inter comunal é complicada e, nas últimas semanas, a situação tem sido agravada pela violência individual e de grupos, bem como a bandidagem.
Na quarta-feira, temendo a um perigo iminente para a segurança das pessoas deslocadas internamente em Bossambele, o ACNUR e outras agências humanitárias organizaram uma operação de evacuação voluntária a um lugar mais seguro para as 58 pessoas que estavam no centro de trânsito. Sob escolta militar francesa, Amina, Abdoulaye e outras pessoas foram levadas de caminhão, com suas bagagens, até uma mesquita em Bangui.
A situação em Bossambele e a operação para evacuá-los acentuam algumas dificuldades enfrentadas por aqueles que tentam fornecer proteção para os grupos deslocados. “Estamos enfrentando uma proteção complexa de desafios que envolve essencialmente a necessidade de proteção individual de grupos deslocados, que estão sob ameaça direta de grupos armados, mas também de violência individual e de grupos”, disse Tammi Sharpe, vice-representante do ACNUR em Bangui.
Na segurança relativa de Bangui, embora desnutrida e desidratada, Amina falou de seu sofrimento com dificuldade, enquanto enfatizava que a evacuação “me salvou e a vida da minha família”.
Sentada em uma sala normalmente utilizada para aulas de Alcorão e visivelmente com dores, ela explicou que tinha se ferido durante o ataque em uma mesquita de Bossambele e a bala ainda estava alojada em sua perna.
Ela acrescentou que “aqueles carniceiros” a tinham perseguido antes que ela chegasse ao centro de trânsito em segurança, acusando-a de ser um membro da Seleka, uma aliança rebelde predominantemente Muçulmana que tomou Bangui em março do último ano.
Como outros membros dos grupos, a maioria dos quais pareciam traumatizados, ela elogiou o pastor cristão que ajudou a proteger o grupo deslocado e organizar uma travessia segura para sair da cidade. O ACNUR se deparou com um número significativo de pessoas que recebem ajuda de amigos de diferentes religiões.
“Passei cada um dos meus 60 anos de vida na RCA, e nunca tive problemas por causa da minha religião”, observou Imam Abdoulaye. Ele acrescentou que depois de deixar a mesquita de Bossambele, ele e um fazendeiro tinham conseguido chegar ao centro de trânsito graças aos “amigos cristão” que eles escondiam em suas pequenas propriedades.
Mas seu otimismo foi duramente castigado nas últimas semanas. Desde o início de dezembro, três de seus seis filhos foram mortos e Abdoulaye disse que acreditava que ele foi alvo porque ele era imã da mesquita.
Ele tinha esperança que a página seria virada com o desenvolvimento político, mas a morte dos seus filhos e do ataque em Bossambele abalaram sua moral.
O ACNUR e a comunidade humanitária também continuam profundamente preocupados. “A violência sectária alcançou níveis perigosos e, como esse episódio revela, a segurança dessas pessoas ao longo prazo depende de combater a impunidade pelos atos de violência e combater as raízes desse ódio crescente ao encontrar meios para promover a coexistência pacifica”, disse Volker Türk , diretor internacional de proteção do ACNUR com sede em Genebra.
Enquanto isso, em Bangui, Abdoulaye e os outros refugiados, incluindo Amina, foram entrevistados por funcionários do ACNUR, avaliados medicamente, e receberam itens de ajuda e alimentos, bem como um lugar para ficar no complexo da mesquita. Mas, em uma cidade com mais de 450 mil deslocados internos, seu futuro parece incerto.
* Nomes alterados por razões de proteção.
Por Hugo Reichenberger em Bangui, República Centro-Africana.
Por: ACNUR